Indicação de Leitura
Para a lição de Juvenis - Currículo do Ano 2: A
História da Igreja
Lição
09: Os Dois Grandes Despertamentos
Aviva, Senhor, a tua obra: Os Grandes Despertamentos Norte-americanos
Alderi Souza de Matos
O fenômeno do avivamento, ou seja, a revitalização
e aprofundamento da experiência religiosa na vida de indivíduos e grupos,
geralmente de modo intenso e dramático, é algo comum a todas as religiões. Não
é diferente com a tradição judaico-cristã. O Antigo e o Novo Testamentos
mencionam vários eventos dessa natureza (2 Rs 22.8—23.3; 2 Cr 7.1-3, 14; 32.26;
34.27; Esdras 9 e 10; Neemias 8 e 9; Lc 3.1-14; Atos 2; etc.) e isso tem se
repetido inúmeras vezes na história do cristianismo. O protestantismo tem sido
um campo fértil para tais ocorrências, inicialmente na Europa e depois nos
Estados Unidos.
1. A contribuição dos calvinistas
A principal matriz do protestantismo
norte-americano foi o puritanismo. Os puritanos, que estiveram entre os
primeiros colonizadores dos futuros Estados Unidos, chegaram à Nova Inglaterra
a partir de 1620, estabelecendo-se inicialmente em Massachusetts, e depois em
Connecticut. Esses calvinistas vindos da Inglaterra, que eventualmente criaram
a Igreja Congregacional, davam muita ênfase à experiência religiosa,
especialmente à experiência de conversão. Somente tornavam-se membros plenos
das igrejas aqueles que podiam dar um testemunho público e aceitável da sua
conversão. Assim, em sua fase inicial o puritanismo foi marcado por uma grande
intensidade religiosa, uma espécie de contínuo avivamento. Essa característica
do puritanismo haveria de influenciar fortemente as diferentes manifestações do
protestantismo norte-americano.
Com o passar dos anos, as novas gerações perderam a
visão e o fervor religioso dos pioneiros. A crescente prosperidade econômica e
o avanço intelectual resultaram em um progressivo entorpecimento da vida
espiritual. Em meio a esse estado de coisas, muitas pessoas começaram a orar
por uma revitalização das igrejas e dos seus membros. No final do século 17 e
início do século 18, era comum os pregadores americanos lamentarem o declínio
da espiritualidade e conclamarem os seus fiéis a orar pelo avivamento. Essas
aspirações começaram a ser satisfeitas fora da Nova Inglaterra, nas colônias
centrais.
Além dos puritanos, outros calvinistas emigraram
para a América do Norte a partir do século 17. Os principais grupos foram os
presbiterianos “escoceses-irlandeses” e reformados da Europa continental. Entre
esses grupos, começou um notável avivamento nas primeiras décadas do século 18,
especialmente na colônia de Nova Jersey. O primeiro nome associado a esse
avivamento foi o de Theodore J. Frelinghuysen (1691-1747), um pastor reformado
holandês influenciado pelo movimento pietista. Pouco depois, outro ministro
começou a ver notáveis resultados em conseqüência de suas pregações, o
presbiteriano Gilbert Tennent (1703-1764). Estava iniciado o que ficou
conhecido como o Primeiro Grande Despertamento.
2. O Primeiro Despertamento
Apesar de ter iniciado em Nova Jersey, o auge do
despertamento ocorreu na Nova Inglaterra, que há décadas vinha orando por essa
visitação. Dois nomes ficaram permanentemente ligados ao evento. O primeiro foi
o de Jonathan Edwards (1703-1758), jovem pastor da Igreja Congregacional de
Northampton, em Massachusetts. Em 1734, enquanto pregava uma série de sermões
sobre a justificação pela fé, surgiu em sua igreja e região um avivamento que
nos anos seguintes alastrou-se por toda a Nova Inglaterra. Além da sua
pregação, profundamente bíblica e comprometida com a soberania de Deus, Edwards
deu outra importante contribuição à causa do avivamento. Em um conjunto de
escritos brilhantes, ele descreveu detalhadamente os fenômenos religiosos do
seu tempo e fez uma série de análises extremamente perspicazes dos mesmos,
destacando seus aspectos positivos e negativos. Dentre essas obras, destacam-se
Fiel Narrativa da Surpreendente Obra de Deus (1737), Marcas Distintivas de uma
Obra do Espírito de Deus (1741) e o grande clássico Tratado Sobre as Afeições
Religiosas (1746).
O outro importante personagem associado ao Primeiro
Grande Despertamento foi o pregador inglês George Whitefield (1714-1770), que
em 1740 fez uma memorável turnê evangelística através de várias colônias,
encerrando-a na Nova Inglaterra. Durante meses, Whitefield, um calvinista
convicto que inicialmente havia trabalhado com John Wesley, pregou quase todos
os dias a auditórios que chegavam a oito mil pessoas. Essa campanha produziu um
enorme impacto em todas as colônias, tornando-se o primeiro evento de amplitude
“nacional” da história dos Estados Unidos.
Nem todos os líderes ficaram entusiasmados com o
avivamento. Na própria Nova Inglaterra surgiu um forte reação da parte de
alguns pastores congregacionais, liderados por Charles Chauncy, de Boston, que
deploravam os excessos do movimento, especialmente o emocionalismo e as
manifestações físicas, julgadas grosseiras e eivadas de fanatismo. Após o
Grande Despertamento, ocorreu um dos períodos mais decisivos da história dos
Estados Unidos, que culminou com a Revolução Americana e a Independência, em
1776. Esse período foi marcado por um acentuado declínio na atividade
religiosa, uma vez que as pessoas estavam mais interessadas nas candentes
questões políticas da época.
3. O Segundo Despertamento
Passado o período da emancipação política, irrompeu
um novo avivamento, que veio a ser muito mais duradouro e influente que o
anterior. O Segundo Grande Despertamento começou por volta de 1800, novamente
entre os presbiterianos, na localidade de Cane Ridge, em Kentucky. Além de mais
vasto e complexo, esse despertamento diferiu do primeiro em outros aspectos
importantes. Se o avivamento anterior limitou-se essencialmente aos
presbiterianos e congregacionais, este atingiu todas as denominações,
especialmente os batistas e os metodistas, que tiveram um crescimento
vertiginoso e tornaram-se os maiores grupos protestantes da América do Norte.
Outra diferença foi geográfica e social: enquanto que o primeiro despertamento
ocorreu em áreas urbanas próximas ao litoral, o segundo irrompeu na chamada
“fronteira,” a região rural do meio-oeste com sua população móvel e sua
instável organização social.
Uma terceira diferença entre os dois avivamentos
diz respeito à sua teologia. Enquanto que o movimento do século 18 teve uma
base solidamente calvinista, com sua ênfase na incapacidade humana e na
iniciativa soberana de Deus, o Segundo Despertamento revelou uma orientação
nitidamente arminiana, dando grande destaque ao potencial de escolha e decisão
do ser humano. Essa característica, que combinava com os ideais de liberdade e
iniciativa individual da jovem nação, encontrou sua expressão mais eloqüente no
avivalista Charles G. Finney (1792-1875). Finney acreditava que o avivamento
podia ser produzido através do uso de técnicas, denominadas “novas medidas”,
que incluíam apelos insistentes e carregados de emoção, aconselhamento pessoal
dos decididos e séries prolongadas de reuniões evangelísticas. Esses elementos
até hoje estão presentes em uma parcela ponderável do evangelicalismo mundial.
4. Desdobramentos posteriores
A partir do Segundo Grande Despertamento, o
avivalismo tornou-se um fenômeno bastante generalizado no protestantismo
norte-americano, especialmente em sua ala evangélica. Esse interesse resultou
em uma curiosa instituição, que perdurou até as primeiras décadas do século 20
– os “camp meetings” (acampamentos avivalísticos). Tratava-se de grandes
ajuntamentos em zonas rurais, por vezes bastante confusos, em que centenas de
pessoas, inclusive famílias inteiras, hospedavam-se em tendas e ouviam por
vários dias uma série de pregadores avivalistas. Essas reuniões foram
precursoras das grandes concentrações evangelísticas realizadas desde o final
do século 19 até o presente, sob a liderança de homens como Dwight L. Moody,
Billy Sunday e Billy Graham.
Além do notável crescimento das igrejas, um dos
frutos mais valiosos e duradouros do Segundo Grande Despertamento foi o
surgimento de um grande número de movimentos de natureza religiosa e social, as
“sociedades voluntárias”. Essas organizações, muitas delas
interdenominacionais, estavam voltadas para causas como educação religiosa,
abolicionismo, temperança, distribuição das Escrituras e, acima de tudo,
missões nacionais e estrangeiras. Alguns exemplos marcantes, por ordem
cronológica de fundação, são os seguintes: Junta Americana de Missões
Estrangeiras (1810), Sociedade Bíblica Americana (1816), União Americana de
Escolas Dominicais (1824), Sociedade Americana de Tratados (1825), Sociedade
Americana de Educação (1826), Sociedade Americana para a Promoção da Temperança
(1826) e Sociedade Americana de Missões Nacionais (1826). O Segundo Grande
Despertamento contribuiu decisivamente para o movimento missionário do século
19, que levou a mensagem evangélica e instituições evangélicas (igrejas,
escolas, hospitais) a todas as regiões da terra, inclusive o Brasil.
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